Gestão Financeira Empresarial – Cuidados Ao Tomar Empréstimos

Gestão Financeira Empresarial – Cuidados Ao Tomar Empréstimos

Tempo de leitura: 9 minutos

A crise pegou a maioria dos empreendimentos. Os impactos da Covid-19 são preocupantes para a sobrevivência das empresas, especialmente as de micro, pequeno e médio portes.

Quer você goste ou não do que está sendo feito, e apesar das dificuldades, o mercado financeiro, o governo e até organizações não governamentais tem buscado socorrer os empresários, visando atenuar o problema, preservar empregos e diminuir os prejuízos à economia.

Mas há uma ressalva que quero apresentar para você. Tenho visto muitos influenciadores ávidos por divulgar as linhas de crédito disponíveis no mercado, desenvolvendo informativos e tutorias para obtê-las. 

Vídeos e artigos sobre o FAMPE – Fundo de Aval às Micro e Pequenas Empresas e o PRONAMPE – Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte jorram minuto a minuto nos meios de comunicação digitais.

Posicionando-se como portadores de boas novas mais parecem garotos propaganda dos bancos – trabalhando gratuitamente para eles, é claro (ou talvez eu é que sou muito inocente).

A impressão que temos é que, a primeira coisa que você deve fazer no momento é tomar crédito. Se já havia uma propensão do empresário recorrer aos bancos para resolver situações que, se bem analisadas, dispensariam o uso do crédito, agora com a pandemia, esta busca desenfreada por recursos financeiros pode gerar uma explosão do endividamento empresarial no futuro próximo.

O uso do crédito para muitas empresas será um remédio amargo, mas, praticamente impossível de ser desprezado. A minha preocupação é a maneira como ele está sendo divulgado.

Assim como um medicamento para ser prescrito precisa de um conhecimento detalhado do paciente, tais como condições de saúde e complexidade e gravidade da doença, a obtenção de empréstimos exige do gestor o conhecimento prévio das suas necessidades, potencial eficácia e capacidade de administração e tratamento do recurso.

Em nossas atividades de Consultoria Financeira Empresarial sempre procuramos entender todos os contextos da empresa para, somente depois, sugerir as ações a serem tomadas.

Outra situação surpreendente que tenho visto em relação ao assunto em questão – crédito para empresas em tempos de pandemia – é o posicionamento dos bancos.

Você tem notado como eles estão se colocam como os verdadeiros “salvadores da pátria”?

Agora os gerentes das instituições financeiras se tornaram os protagonistas das suas campanhas publicitárias.

Com aquela voz tranquila, aquele discurso emocionante aludindo ao momento de crise, os bancos são colocados como entidades generosas, compreensivas, totalmente abertas ao diálogo:

  • Nós estamos com você.
  • Tudo vai passar.
  •  Vamos abrir mão do nosso lucro para que você sobreviva a esse momento conturbado.

E na sequência surgem as propostas tentadoras que poderão ser grandes armadilhas financeiras, possivelmente descobertas alguns meses adiante.

Vejo três possíveis armadilhas, propostas muito comuns no momento, que poderão trazer consequências desastrosas:

1) Empréstimos com Garantia de Imóvel

Eles (os bancos) dizem que estão flexibilizando a concessão de crédito para facilitar a vida do empresário.

Na verdade, eles estão se aproveitando do momento par induzir as pessoas a empenharem um bem valioso, não só do ponto de vista financeiro, mas também afetivo.

O que eles estão fazendo é usar uma brecha para ampliar o acesso ao crédito mantendo toda a segurança possível para si. Lá na frente se a “corda estourar”, quem será o lado mais fraco?

Quando esse momento chegar, as mesmas ovelhinhas que se apresentaram para você nas propagandas vão simplesmente mostrar as garras, mantendo o empresário dependente da instituição financeira, pagando juros sobre juros, enroscados em diversas linhas de crédito.

Não estou dizendo que o banco não deva ter garantias, mas se você analisar com calma o conjunto de ações que estão sendo propostas, elas são extremamente desproporcionais.

Imagine você dar o seu imóvel de garantia e pagar juros de mais de 12% ao ano (vi, com os meus próprios olhos uma propaganda que oferecia crédito com imóvel de garantia com juros de 1% ao mês).

Isso é parceira do banco ou oportunismo?

Estão se valendo do momento onde as emoções estão à flor da pele, somadas a preocupações, incertezas e boa vontade.

Sei que há muito empresário querendo proteger empregos de funcionários e honrar os compromissos com fornecedores. Mas se ele não olhar atentamente para o seu “financeiro” ele pode cometer erros irreparáveis para a saúde financeira da empresa e para o seu próprio bem estar.

2) Empréstimos com carência:

Outra possível armadilha são os empréstimos com carência.

Esse tipo de crédito os bancos sempre tiveram disponível. Mas porque não o ofereciam anteriormente? Já atendi clientes onde conseguimos carência de 12 meses para iniciar pagamentos, mas tudo feito com um detalhado planejamento financeiro.

Neste momento, a carência é uma necessidade, ninguém tem dinheiro disponível. Mas eles estão colocando como se é iniciativa deles (bancos), fruto de uma generosidade incomparável. A verdade é que perceberam que se não fizessem desta forma também sofreriam profundos impactos em seus resultados financeiros.

O problema está novamente na tradição do empresário em ter pouco ou nenhum controle/conhecimento das suas finanças. Colocar a obtenção de crédito como ação imediata e necessária é bastante arriscado.

3) Dificuldade de Obter os Empréstimos Subsidiados Pelo Governo

Muitos empresários estão alertando sobre as dificuldades de obter as linhas de crédito subsidiadas pelo governo federal. Sabemos que há questões burocráticas e nem sempre as empresas estão devidamente organizadas para poder obter estes empréstimos.

Mas eu não me surpreenderia se este problema estiver sendo influenciado pelas próprias instituições financeiras, especialmente as que não tem ligação direta com o governo.

Qual o raciocínio?

Ora, porque eu vou facilitar o acesso a um crédito a juros baixíssimos e carência de vários meses, subsidiado pelo governo se posso entregar minhas próprias linhas de crédito, em condições mais favoráveis para a minha instituição?

Não estou falando isso sem fundamento. Se, antes da crise, já presenciei bancos dificultarem o acesso a outros programas governamentais, porque isso não se repetiria agora?

O que eu devo fazer?

Antes de correr ao banco desesperadamente, considere algumas ações para mitigar problemas futuros:

  1. Faça um levantamento detalhado da situação financeira da empresa pré-pandemia. É preciso entender qual era o nível de saúde financeira (ou doença) da empresa; talvez ela já estivesse doente antes e você até já desconfiava. Precisa então saber o tipo de problema e a sua proporção;
  1. Analise ações a serem tomadas antes de empréstimos: redução de despesas, renegociação com fornecedores, reorganização de processos, avaliação de recursos disponíveis, etc.
  1. Considere o uso de recursos próprios para atenuar a necessidade de crédito. Assim como é melhor perder um dedo do que a vida, é melhor perder um funcionário, um produto, um contrato do que perder a empresa;
  1. Defina com a maior precisão possível (sabemos que o número dificilmente será preciso, mas devemos ficar mais próximos possível da realidade) a quantia de crédito que precisa e negocie com firmeza, não aceite a primeira proposta que eles fizerem;
  1. Imediata ênfase na gestão financeira, visando ter o controle total dos próximos 12, 24 e 36 meses para que o que foi projetado seja realizado.

Como falamos anteriormente, tomar empréstimos sem uma boa análise financeira do negócio é como comprar um remédio na farmácia sem prescrição médica. 

O risco de ter problemas é alto pois uma receita é fruto de um diagnóstico do médico para identificar qual o problema, a gravidade e qual tipo de medicamento é mais adequado para a situação.

Assim deve ser na ministração dos medicamentos (crédito) para uma empresa. Muitos empresários vão ao banco e solicitam suas linhas de crédito na base do “achômetro” (automedicação), fazendo estimativas superficiais.

O enredo de uma tragédia anunciada

Eu já vi esta novela. Veja o enredo:

  1. Desesperado, com vontade de manter sua empresa e visando proteger o emprego dos funcionários vai ao banco e usa linhas de crédito;
  2. Tem problemas para ficar em dia com os pagamentos e começa a atrasar suas contas
  3. O banco começa a cobrar juros e oferece novas linhas de crédito para “tapar” o buraco;
  4. Ainda sem planejamento você continua pegando estes empréstimos dizendo para si mesmo: “é a última vez”
  5. Esta situação se prolonga por meses e até anos
  6. Você mina o crescimento da sua empresa e, por consequência limita sua capacidade de conquistar a independência financeira.

Muitas vezes, investir em ajuda profissional não significa mais gastos, pelo contrario, é uma forma de não cometer erros, de não perder dinheiro, portanto uma forma de encontrar soluções alternativas viáveis e mais vantajosas.

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